Postado por Antônio Carlos Tanure
Buscando Deus
Este texto foi construído com informações selecionadas da entrevista de Amit Goswami, concedida ao Programa “Roda Viva” da TV Cultura, no dia 12/3/2001.
Amit Goswami, físico, doutorado em física nuclear, nasceu na Índia. A partir de 1968 e durante 32 anos ele foi pesquisador e professor titular de fisica teórica da Universidade de Oregon/EUA. Posteriormente mudou seu foco de pesquisa para cosmologia quântica e aplicações da mecânica quântica ao problema da relação mente-corpo. Publicou o polêmico livro A Física da Alma. Alia em seu trabalho o conhecimento de tradições místicas com exploração científica, buscando unificar espiritualidade e física quântica. É autor de outros livros traduzidos para o português como A Janela Visionária, O Médico quântico, O Universo Autoconsciente e Evolução Criativa das Espécies.
A mudança da ciência de uma visão materialista para uma visão espiritualista foi quase totalmente devida ao advento da Física Quântica. Ao mesmo tempo houve algumas mudanças em Psicologia transpessoal, em Biologia evolucionista e em medicina. Mas acho que é correto dizer, que a revolução que a Física Quântica causou na Física na virada do século, seria baseada nas transições contínuas, não apenas movimento contínuo, mas também descontínuo. Não localidade. Não apenas transferência local de informações, mas transferência não-local de informações. E, finalmente, o conceito de causalidade descendente.
O cérebro nos dá a consciência e a inteligência, todas essas coisas. Mas descobrimos, na Física Quântica que a consciência é necessária, o observador é necessário. O observador que converte as ondas de possibilidades, os objetos quânticos, em eventos e objetos reais. Essa idéia de que a consciência é um produto do cérebro nos cria paradoxos. Em vez disso, cresceu a idéia que a consciência é também causal. Assim, cresceu a idéia da causalidade descendente.
No conceito de causalidade descendente, a Consciência escolhe entre as possibilidades, o evento real. Agora sabemos como Deus – se quiser a Consciência, interage com o mundo: através da escolha das possibilidades quânticas.
E qual é o papel do observador? É a pergunta que abre a integração entre Física e espiritualidade. Na Física Quântica por sete décadas tentou-se negar o observador. Não há fenômeno no mundo a menos que ele seja registrado – e, este é o papel do observador. Pela Física Quântica nenhum fenômeno é um fenômeno, a menos que seja registrado por um observador, na consciência de um observador. E isso se tornou a base da Nova Ciência.
A Matemática Quântica prevê o desenvolvimento de ondas de possibilidades, com a matéria sendo retratada como ondas de possibilidades. Nenhum evento real é previsto pela Física Quântica. Para conectar a Física Quântica às observações reais, não vemos possibilidades e probabilidades, na verdade vemos realidades. Esse é o problema das medições quânticas.
Por outro lado se considerarmos que é a consciência que escolhe entre as possibilidades, nós teremos uma resposta, mas a resposta não é matemática. Teremos de sair da matemática. Não existe Matemática Quântica para este evento de mudança de possibilidades em eventos reais, que os físicos chamam de ‘colapso da onda de possibilidade em realidade’.
É essa descontinuidade do colapso que nos obriga buscar uma resposta fora da Física. O que é interessante é que se postularmos que a consciência – o observador, causa o colapso da onda de possibilidades, escolhendo a realidade que está ocorrendo, podemos fazer a pergunta: qual é a natureza da consciência? E encontraremos uma resposta surpreendente.
Essa Consciência que escolhe e causa o colapso da onda de possibilidades não é a consciência individual do observador.
Em vez disso, é uma Consciência Cósmica. O observador não causa o colapso em um estado de consciência normal, mas em um estado de consciência anormal, no qual ele é parte da Consciência Cósmica. Isso é muito interessante.
O que é a Consciência Cósmica diante do conceito de Deus, do qual os místicos e teólogos falam?
Eu obtive sucesso em Física dentro da Física materialista. Mas, quando comecei a trabalhar no problema da medição quântica, eu realmente tentei resolvê-lo dentro do materialismo. Enquanto todos nós trabalhávamos, falei com muitos físicos que trabalhavam no problema (este é o problema mais estudado da Física, um dos mais estudados). E todos tentavam resolver este paradoxo: se a consciência é um fenômeno cerebral, obedece à Física Quântica, como a observação consciente de um evento pode causar o colapso da onda de possibilidades levando ao evento real que estamos vendo? A consciência em si é uma possibilidade. Possibilidade não pode causar um colapso na possibilidade.
Qual é a natureza da consciência, da qual as pessoas falam quando se pensa além do materialismo? Eu pude ver, eu realmente vi além do pensamento, tive a percepção de que a Consciência é a base do Ser, e essa percepção soluciona o problema da medição quântica.
Consciência é base de todos os Seres. Esse salto conceitual, esse salto quântico perceptivo me fez reconhecer que o modo como espiritualistas vêem a Consciência, é o modo certo de ver a Consciência. E esse modo de ver a consciência resolve o problema da medição quântica. Ele nos dá a base para uma Nova Ciência.
Na Física Quântica, há o problema da medição. Como as possibilidades tornam-se eventos reais, temos espaço para uma Consciência, e ela deve ser uma Consciência Cósmica. Há uma semelhança com o modo como Deus é retratado, pelo menos na “subespiritualidade tradicional”, não na mente popular.
A mente popular considera Deus um imperador, um super-humano sentado no céu. Essa imagem de Deus não é científica e espero que esteja claro, que não estamos falando em Deus dessa forma, mas Deus nessa Consciência mais Cósmica, nessa forma mais estrutural.
Não há paradoxo, se presumirmos que a Consciência que causa o colapso da onda de possibilidades em eventos reais é uma Consciência Cósmica. E o evento do colapso em si nos dá a separação matéria-objeto do mundo. Assim, não só resolvemos o problema da medição quântica, como também damos uma nova resposta de como a consciência de um torna-se várias. Como ela se divide em matérias e objetos, para poder ver a si mesma. E essa idéia de que o mundo é um jogo da consciência, um jogo de Deus, que é uma idéia muito mística, voltou à tona.
Agora estamos fechando o circulo e, vemos que precisamos de Deus: há movimentos descontínuos no mundo para os quais não existe explicação matemática ou lógica. Ainda assim, é totalmente objetivo, não é arbitrário. Deus age de forma objetiva, bem definida. A Consciência Cósmica não é subjetiva, não é a consciência individual que afeta o mundo. Isso ocorre de forma cósmica.
A ciência detém seu poder, sua objetividade e, ainda assim, temos agora a descontinuidade, temos a interconectividade e podemos falar sobre vários assuntos dos quais os místicos tradicionalmente falam.
O que ocorre nessa integração e o que ocorreu por um tempo mesmo antes de essa integração começar, é que começamos a entender a natureza da criatividade. E a falsa idéia de que cientistas só trabalham com idéias racionais e matemáticas, ela está aos poucos caindo.
Agora, os quase cem anos de pesquisas sobre criatividade estão mostrando, que os cientistas também dependem da intuição. Eles também dependem de visões criativas para desenvolver sua ciência. Nem tudo é racional, matemático; nem tudo é pensamento racional.
Eu tive uma percepção. Não posso descrevê-la em termos de espaço-tempo. Eu estava fora do espaço-tempo, experimentando diretamente a Consciência como a base do Ser. É esse tipo de experiência que dá a base para ficarmos convencidos, para termos certeza de que a realidade é algo mais do que o espaço-tempo no mundo em movimento faz parecer.
Cientistas usam a intuição para desenvolver sistemas que estão fora deles, o que chamo de criatividade externa. E isso se torna uma camuflagem dos verdadeiros mecanismos do mundo para eles. Enquanto espiritualistas mantêm-se com a percepção, mudam suas vidas e incidentalmente, mudam o mundo externo. Mas eles sabem que aquela percepção que tiveram é a coisa fundamental que gera o mundo. Para eles, a Consciência é Cósmica e isto é algo determinado. Para os cientistas, a mesma descoberta é possível, mas eles ignoram o chamado e prestam mais atenção ao que ocorre no cenário externo. Acho, que se todos nós compartilharmos isso, o mundo poderá mudar.
É importante compartilharmos nossas histórias pessoais e acabar com o mito de que os cientistas são apenas pensadores racionais. Eles também têm percepções que vão muito além do pensamento racional.
Essa questão de Deus contra o Mal é interessante. Segundo a visão da Física Quântica, existem as forças da criatividade e as forças do condicionamento. Na Física Quântica vemos claramente o papel da Consciência Cósmica, que eu chamo de “Ser Quântico”, no qual há criatividade, há forças criativas. E se perdemos essa criatividade, ficamos condicionados. E o condicionamento nos faz parecidos com máquinas.
Assim, o malefício maior que a Nova Ciência nos traz é o condicionamento. Pois é ele que nos faz esquecer a divindade que temos, o poder criativo que temos e a força criativa que realmente representa o que buscamos quando invocamos Deus.
Por trás de todas as religiões de que há apenas Deus e que o Bem e que o Mal são uma divisão, uma necessidade da criação, não é fundamental, ou seja, o diabo não é igual a Deus; o diabo é uma criação subseqüente. É útil pensarmos em termos de Bem e Mal, mas às vezes é preciso transcender isso, é preciso perceber que Deus é tudo. Esse é o cenário que a Física Quântica defende.
Na Física Quântica, existe a idéia de que todos os Corpos de Consciência, tudo o que pertence à Consciência e a Inconsciência são possibilidades.
Na Física Quântica é muito claro que devemos esperar. Esperar pela intuição, ver se há um salto quântico, uma resposta criativa como muitos a chama. Se uma resposta criativa irá surgir. E é essa resposta criativa que é a resposta correta para solucionar a ambigüidade em questões éticas. Neste salto quântico da percepção que virá, vai nos permitir tomar a ação correta. É nisso que a Física Quântica está nos ajudando, é nessa conclusão que ela está nos ajudando
A física é matemática? De onde vem a Matemática? Na Física Quântica, procuramos insistentemente uma forma matemática de encerrar a Mecânica Quântica. Uma forma matemática para entender a medição quântica. Não fomos capazes.
De acordo com a mecânica quântica as descontinuidades vão continuar existindo sem explicação matemática. E, por não haver explicação matemática, portanto, há espaço para o livre-arbítrio, para Deus, Consciência e colapso.
Tudo isso entrou para a Física porque atingimos o conhecimento e a sabedoria, de que existe o princípio da incerteza, existem a probabilidade e possibilidades. E por existirem probabilidade e possibilidades, deve haver um agente que causa o colapso das possibilidades em eventos reais. E esse agente não pode ser matemático, porque se for, não poderá haver livre-arbítrio: seria determinista. Mas não é determinista. O princípio da incerteza é fundamental.
Se o corpo físico morre, o que resta? Se a Consciência é a base do Ser, vem a idéia de que o que resta é a Consciência. É a primeira pista. A segunda pista é que, tudo é possibilidade no modo quântico de ver as coisas. Então, não é irrelevante dizer que as possibilidades podem viver. Algumas possibilidades morrem com o corpo material e o cérebro, mas pode haver outras possibilidades, outras possibilidades que se modificam ao longo da nossa vida e essas modificações das probabilidades das possibilidades podem formar uma confluência que possa viver mais tarde na vida de outra pessoa.
Tanto a causalidade descendente quanto a ascendente tem papel fundamental na Nova Física, na Nova Ciência. Essa é uma das virtudes que temos. A Nova Ciência absorve a Velha Ciência nos limites do princípio da correspondência, no limite de que poderíamos falar apenas em termos de probabilidades para um grande número de coisas e eventos.
A Velha Ciência não desaparece. Não poderia. É solidamente baseada em dados experimentais. A Nova Ciência expande a velha Ciência em arenas com as quais a Velha Ciência não pode lidar como eventos singulares de criação, de criatividade.
Sobre voltar no tempo, há experimentos quânticos. Não podemos mais descartar a viagem no tempo, mas ela envolve muito mais, pois ainda temos sérios problemas de como trazer os efeitos quânticos aos macrocorpos. Pois os efeitos quânticos são muito destacados apenas em objetos microscópicos e não tão destacados em macro-objetos. A situação da medição é uma exceção. Mas normalmente descobrimos apenas raios ‘laser’, supercondutores, poucas coisas, poucos macro-objetos em que os efeitos quânticos persistem.
Há muitas coisas que são fantasias e há muitas coisas que envolvem Deus. A imaginação, a parte mental de nossas vidas, a parte interna de nossa vida, é fundamental no que fazemos no mundo externo.
Por estarmos igualmente envolvidos com o mundo externo e o interno, pelo fato de a subjetividade ter voltado à ciência, estamos na Nova Ciência validando o conceito de que talvez, devamos levar algumas de nossas fantasias a sério.
A vida interna lida com o pensamento e a beleza, os arquétipos de uma forma diferente que pode a vida externa materialista. E, focalizando na vida interna, não só podemos nos transformar (essa é a parte mística), mas também podemos ter enormes visões sobre o que criar e como criar sobre nossas artes, sobre nossa música e até sobre a ciência.
Acho muito importante dizer que, sem reconhecer a Consciência e sem reconhecer o valor da nossa vida interna, sem reconhecer o valor da transformação, nunca mudaremos a violência na sociedade.
A Nova Ciência, o Novo Paradigma é extremamente importante, porque sempre enfatiza a criatividade.
Meu novo lema em vez do cartesiano “eu penso, logo existo” (e pensamento é uma condição behaviorista), meu novo lema é: “escolho, logo existo”. E se “escolho, logo existo”, posso escolher a não-violência.
Se essa mudança para o novo paradigma vier logo, talvez possamos realmente lidar com a violência de uma forma realmente prática, em vez de apenas verbalmente, como fazemos.
Deus Segundo Spinoza
– Deus falando com você –
O texto abaixo é de Baruch Espinoza – nascido em 1632 em Amsterdã, falecido em Haia em 21 de fevereiro de 1677, foi um dos grandes racionalistas do século XVII dentro da chamada Filosofia Moderna, juntamente com René Descartes e Gottfried Leibniz. Era de família judaica portuguesa e é considerado o fundador do criticismo bíblico moderno.
“Pára de ficar rezando e batendo o peito! O que eu quero que faças é que saias pelo mundo e desfrutes de tua vida. Eu quero que gozes, cantes, te divirtas e que desfrutes de tudo o que Eu fiz para ti.
Pára de ir a esses templos lúgubres, obscuros e frios que tu mesmo construíste e que acreditas ser a minha casa. Minha casa está nas montanhas, nos bosques, nos rios, nos lagos, nas praias. Aí é onde Eu vivo e aí expresso meu amor por ti.
Pára de me culpar da tua vida miserável: Eu nunca te disse que há algo mau em ti ou que eras um pecador, ou que tua sexualidade fosse algo mau. O sexo é um presente que Eu te dei e com o qual podes expressar teu amor, teu êxtase, tua alegria. Assim, não me culpes por tudo o que te fizeram crer.
Pára de ficar lendo supostas escrituras sagradas que nada têm a ver comigo. Se não podes me ler num amanhecer, numa paisagem, no olhar de teus amigos, nos olhos de teu filhinho… Não me encontrarás em nenhum livro! Confia em mim e deixa de me pedir. Tu vais me dizer como fazer meu trabalho?
Pára de ter tanto medo de mim. Eu não te julgo, nem te critico, nem me irrito, nem te incomodo, nem te castigo. Eu sou puro amor.
Pára de me pedir perdão. Não há nada a perdoar. Se Eu te fiz… Eu te enchi de paixões, de limitações, de prazeres, de sentimentos, de necessidades, de incoerências, de livre-arbítrio. Como posso te culpar se respondes a algo que eu pus em ti? Como posso te castigar por seres como és, se Eu sou quem te fez? Crês que eu poderia criar um lugar para queimar a todos meus filhos que não se comportem bem, pelo resto da eternidade? Que tipo de Deus pode fazer isso?
Esquece qualquer tipo de mandamento, qualquer tipo de lei; essas são artimanhas para te manipular, para te controlar, que só geram culpa em ti.
Respeita teu próximo e não faças o que não queiras para ti. A única coisa que te peço é que prestes atenção a tua vida, que teu estado de alerta seja teu guia.
Esta vida não é uma prova, nem um degrau, nem um passo no caminho, nem um ensaio, nem um prelúdio para o paraíso.
Esta vida é o único que há aqui e agora, e o único que precisas.
Eu te fiz absolutamente livre. Não há prêmios nem castigos. Não há pecados nem virtudes.
Ninguém leva um placar. Ninguém leva um registro.
Tu és absolutamente livre para fazer da tua vida um céu ou um inferno. Não te poderia dizer se há algo depois desta vida, mas posso te dar um conselho. Vive como se não o houvesse. Como se esta fosse tua única oportunidade de aproveitar, de amar, de existir. Assim, se não há nada, terás aproveitado da oportunidade que te dei. E se houver, tem certeza que Eu não vou te perguntar se foste comportado ou não. Eu vou te perguntar se tu gostaste, se te divertiste… Do que mais gostaste? O que aprendeste?
Pára de crer em mim – crer é supor, adivinhar, imaginar. Eu não quero que acredites em mim. Quero que me sintas em ti. Quero que me sintas em ti quando beijas tua amada, quando agasalhas tua filhinha, quando acaricias teu cachorro, quando tomas banho no mar. Pára de louvar-me! Que tipo de Deus ególatra tu acreditas que Eu seja? Me aborrece que me louvem. Me cansa que agradeçam. Tu te sentes grato? Demonstra-o cuidando de ti, de tua saúde, de tuas relações, do mundo. Te sentes olhado, surpreendido?… Expressa tua alegria! Esse é o jeito de me louvar.
Pára de complicar as coisas e de repetir como papagaio o que te ensinaram sobre mim. A única certeza é que tu estás aqui, que estás vivo, e que este mundo está cheio de maravilhas. Para que precisas de mais milagres? Para que tantas explicações? Não me procures fora! Não me acharás. Procura-me dentro… aí é que estou.
Einstein, quando perguntado se acreditava em Deus, respondeu: “Acredito no Deus de Spinoza, que se revela por si mesmo na harmonia de tudo o que existe, e não no Deus que se interessa pela sorte e pelas ações dos homens”.
“As pessoas não são nobres desde o nascimento, mas se enobrecem por meio de suas ações” – Daisaku Ikeda